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“O eu não é mais senhor em sua própria casa” – O capitalismo adoecedor

  • Foto do escritor: Psicanalista Michele Maia
    Psicanalista Michele Maia
  • 19 de fev. de 2020
  • 4 min de leitura

Atualizado: 22 de jul. de 2020


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Com esta frase, Freud quis explicitar que o homem tem suas ações fortemente influenciadas por uma instância que foge do seu racional, não sendo plenamente senhor de sua vida, e tendo seu lado primitivo atuante em suas atitudes. Chamou sua tese de a terceira ferida narcísica da humanidade, vindo após o heliocentrismo de Copérnico e o evolucionismo de Darwin.


O mito de Narciso retrata o personagem da mitologia grega vaidoso e orgulhoso. Assim como Narciso o homem moderno não cansa de olhar para si mesmo encantado por sua “beleza”. Seu egocentrismo não permite que se enxergue em sua fragilidade. Assim como a humanidade já achou que as estrelas giravam em torno da terra, até a descoberta de Copérnico, o homem seguiu acreditando ser o centro, o cerne, o grande dono e senhor de tudo que o rodeia, principalmente de si próprio. Certamente a afirmação de Freud causou impacto à sociedade da época por contrapor paradigmas tão idealizados à humanidade.


A revelação do inconsciente como capaz de armazenar conteúdos não disponíveis no nível consciente, conteúdos reprimidos e portadores de leis próprias, assustou o homem ao se ver incapaz de ser conhecedor pleno de suas próprias verdades.


A dificuldade de aceitação deste fato flagrado por Freud na transição entre os séculos XIX e XX, pode ser observado ainda na atualidade. A humanidade contemporânea, vivente do mundo capitalista, exige cada vez mais de si próprio em termos de produção, e nega suas pulsões e desejos escondidos em seu inconsciente. Esta atitude relega ao homem à condição de mero piloto automático de si mesmo.


A importância da psicanálise se faz mais latente à medida em que é exigido da humanidade uma homogeneização cada vez maior para atender a expectativas ainda mais irreais ou exaustivas. O humano moderno aprende desde cedo a reagir instantaneamente aos estímulos, não se permitindo a ponderação, o contemplar tão necessário às sábias escolhas que poderiam levar o indivíduo à real liberdade, alcançada através da possibilidade da inovação e criação. A vida contemporânea tendo como seu ideal o modelo de rebanho, em que todos pensam e agem de mesma forma, estando acomodados e plenamente adaptados a um modo de vida e a um conjunto de ideais avalizados como corretos e morais por determinados grupos dominantes, segue oprimindo a livre expressão e dificultando a individuação do sujeito, o mantendo pressionado a competir todo o tempo e a produzir incessantemente e instantaneamente. Muitas vezes lutando contra seu próprio corpo e natureza.

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Com o passar dos anos desde a descoberta de Freud, quando evidenciou para o mundo mais esta ferida narcísica, pouco mudou nos paradigmas de onipotência humana. O homem continua apostando na sua capacidade de controle do meio e autocontrole, se utilizando exclusivamente do seu racionalismo para a resolução de seus problemas.


Na sociedade de consumo tudo pode ser comprado, inclusive o bem estar. Uma frustração cuja causa seja desconhecida pode ser resolvida com a obtenção de um novo aparelho tecnológico da moda. Se isso ainda não for o suficiente, a necessidade de se deparar com seus desejos inconscientes pode ser substituída pela prostração disfarçada de relaxamento proporcionada por um medicamento, proporcionando a fuga de seus próprios sentimentos e inquietações.


É notável o crescimento do consumo de medicamentos psiquiátricos em nossa sociedade atual. Diante das mazelas da alma, o medicamento foi mais prontamente aceito e reconhecido do que o confrontamento com seu inconsciente e o reconhecimento de suas reais necessidades. Mais uma vez, o imediatismo e a compulsividade do comportamento humano moderno são reforçados em detrimento da intuição e da liberdade.


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Busca-se de forma neurótica a resolução de seus problemas passando por cima das necessidades de reflexão e olhar para dentro de si, formando uma sociedade cada vez mais doente e dependente de muletas forjadas pelo consumismo.


Falsos problemas começam a ser criados a partir do momento em que falsas necessidades são estabelecidas. A meta nunca poderá ser alcançada, pois a partir do momento em que é alcançada, a mesma é dobrada. Desta forma, o objetivo nunca é satisfeito, e o homem se mantem cada vez mais afastado da real finalidade da vida, a criação, o novo. Sem a possibilidade de criar, o homem nunca será livre e a frustração será constante. Diante de tantos fracassos, tantas provas de ineficiência, o humano deprime-se conformado com sua incompetência diante do mundo, vivendo nele como um neurótico.


O ideal de vida vendido na mídia mercadológica, a felicidade irreal exposta nas mídias sociais, os altos preços de bens materiais sempre parecerão inatingíveis aos olhos do homem moderno, e talvez realmente sejam, se levarmos em consideração que como roedores corremos dentro de rodas que não nos levam a lugar algum, pois quando chegamos, a duras penas, em um degrau, outros muitos já nos foram estabelecidos. Ou talvez não sejam inatingíveis, se quer desejáveis, a partir do momento em que olhamos para dentro de nós mesmos e passamos a funcionar como pessoas intuitivas, colocando nossa inteligência a serviço do nosso bem real. Percebendo e elencando nossas reais necessidades, nossos reais desejos e nos fazendo capazes de constante criação. Traçando nossos próprios objetivos, conseguiremos nos libertar desta vida artificial que nos trata como engrenagens de uma grande máquina.


Psicanalista Michele Maia

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